Nesta segunda-feira, 22, o STF (Supremo Tribunal Federal) encerrou a votação do julgamento da Ação Penal 470 - o mensalão - e condenou os petistas José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil do governo Lula; Delúbio Saores, ex-tesoureiro do PT, e José Genoino, ex-presidente do Partido dos Trabalhadores, pelo crime de formação de quadrilha. A maioria dos ministros - 6 votos a 4 - condenou também por formação de quadrilha, o ex-publicitário Marcos Valério e mais sete envolvidos no maior escândalo já registrado na história política do Brasil. Agora, os ministros voltarão a se reunir nesta quarta-feira, 23, para oficializarem todos os votos, discutir como ficarão os casos de empates e também definirem sobre a dosimetria (cálculo) das penas para os condenados. Os petistas já haviam sido condenado por corrupção ativa.
Não foi caixa-dois
Com o final do julgamento e, de acordo com todas as condenações proferidas até o momento, o STF jogou por terra a tese da defesa. que alegava a prática "apenas de caixa-dois", como se isso não fosse crime, e provou que o mensalão - arrecadação de recursos para compra de votos no Congresso Nacional - existiu sim, e os criminosos usaram para isso dinheiro público do Banco do Brasil, da Visanet, além de emprego de recursos advindos de empréstimos fraudulentos. E tudo isso com a prática de crimes de peculato, empréstimos fraudulentos, corrupção - ativa e passiva - além de formação de quadrilha.
Já haviam votado o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo, que condenou 11 dos 13 acusados pelo Ministério Público, e o ministro revisor, Ricardo Lewandowski, que absolveu todos os réus. Acompanharam o revisor, as ministras Rosa Weber, Carmem Lúcia e o ministro Dias Toffoli. Para eles, o que houve foi "co-autoria em vários crimes", não formação de quadrilha. E acompanharam o relator, condenando os réus, os ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurério de Mello, Celso de Mello e o presidente da Corte, Carlos Ayres Britto. Eles provaram que um grupo de pessoas, entre elas os três petistas, promoveu uma sociedade para a prática de vários crimes, o que caracteriza a formação de quadrilha, como denunciou o então Procurador-Geral da República, Antonio Fernando de Souza, que, inclusive, classificou José Dirceu como "o chefe da quadrilha".
Fux: mais de dois anos
Em seu voto, o ministro Luiz Fux afastou a tese de coatoria do crime, já que a associação durou mais de dois anos, o que demonstra que o conluio não era "transitório”. "A atuação desses núcleos ocorreu por um período de mais de dois anos e somente teve um fim com a eclosão do escândalo que foi chamado de mensalão".
"Espúria aliança"
Segundo Gilmar Mendes, quinto magistrado a votar, a "engrenagem ilícita" criada pelos envolvidos foi usada para alcançar diversos interesses. Para o ministro, não foram atendidas somente as demandas do PT, mas também as de empresas de Marcos Valério (foto abaixo), dos partidos da base e dos banco envolvidos no esquema. "Os denunciados estabeleceram um esquema de recursos e compra de parlamentares, para negociar apoio político e pagar dívidas pretéritas".
Número 13 - sintomático
Em seu voto, o ministro Marco Aurélio de Mello relembrou do discurso que fez em sua posse como Presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em 2006, ocasião em que fez duas críticas contra os envolvidos nesse processo do mensalão."No caso houve a formação de uma quadrilha das mais complexas envolvendo na situação concreta o núcleo dito político, o financeiro e o operacional. Mostraram-se os integrantes em número de 13, é sintomático o número. Mostraram-se os integrantes afinados conforme presenciamos nas sessões anteriores. Cheguei a dizer que a integração entre os réus lembrava a máfia italiana", disse o ministro, que afrimou que houve desfaçatez dos integrantes, que nem se incomodavam com a quantidade de dinheiro nos envolopes e malotes transportados.
Recado aos mensaleiros
Já o ministro Celso de Mello também fez uma abordagem crítica à atuação dos réus. "É importante enfatizar, considerados os elementos probatórios produzidos nos autos, que a análise do contexto em questão evidencia que o crime de quadrilha restou plenamente aperfeiçoado e comprovado".
O ministro também deixou claro que a formação da quadrilha ameaça a paz pública: "A simples existência do delito de quadrilha, a simples consumação deste tipo penal associativo constitui agressão permanente contra a sociedade civil, qualifica-se como estado antijurídico que tem a sua objetividade de todos os cidadãos à tranquilidade pública".
O decano do tribunal mandou ainda um recado para os petistas. Ele afirmou que o resultado nas urnas em uma eleição não desobriga qualquer pessoa a respeitar as leis. "Votações eleitorais não constituem, em um Estado fundado em bases democráticas, não se qualificam nem constituem um impedimento da punibilidade, ainda que ungidos de poder, não se subtraem ao alcance das leis da República. Afinal, a ideia de República traduz um valor essencial que exprime um dogma fundamental: o da plena responsabilidade de todos perante a lei, além do primado da igualdade jurídica. Esse dogma deve prevalecer sempre. Ninguém tem legitimidade para transgredir as leis de nosso país".
"Modo delituoso"
Ayres Britto, presidente da Corte e último a falar, também viu ameaça à paz pública na formação do grupo. Para ele, os fatos que constam dos autos foram suficientes para a caracterização do crime. "Sua Excelência, o ministro Peluzo, falou de paz pública, como confiança que a população tem no controle estatal da criminalidade. A sociedade não pode perder a crença de que seu Estado dará a resposta adequada. O trem da ordem jurídica não pode descarrilhar".
O ministro também falou sobre o tempo de associação entre as pessoas que formavam o esquema com o intuito de cometer crimes. "Perdurou esta protagonização delituosa por dois anos e meio, aliás, como seria de se esperar. E é esse tipo de aliança política e parlamentar que o direito execra e excomunga. O que estamos aqui julgando é o modo delituoso de fazer política".
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